terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Canção da Separação


Canção da separação 


Não lembre de nós dois
eu não serei seu amor
em outros tempos, talvez
pudéssemos acreditar
-
Mas somos grandes
demais para isso
Por isso
não lembre de nós dois
-
Não me torne responsável
pelas suas emoções
e por suas expectativas
eu nunca disse que sim
-
Por isso não lembre de nós dois
não me faça sentir culpa
pelos seus sentimentos
não me constranja com seu amor
-
Eu não posso libertá-lo
do tédio e da infelicidade
de uma vida que você escolheu
Por isso não lembre de nós dois

Eu poderia manter você aqui
para distrair minhas carências
e alimentar minha vaidade
mas essa não é a minha onda
-
Eu sou apenas aquilo que
você deseja que eu seja
eu não sou real
por isso não lembre de nós dois.

quando eu disse não, entenda, 
optei pela aridez da verdade
para que nenhuma dor 
seja grande demais 

Talvez eu goste de você
mais do que você mesmo
já não somos mais tão ingênuos 
para acreditar.



Por isso não lembre de nós dois.




Andréa Beheregaray
Da série
Canção sem som.

sábado, 17 de dezembro de 2016

Supremo Orgulho




"Mas eu sou a manhã: apago as estrelas
Hás de ver-me, beijar-me em todas elas
Mesmo na boca da que for mais linda.

E quando a derradeira, enfim vier
Nesse corpo vibrante de mulher
Será o meu que hás de encontrar ainda!"

Florbela Espanca
08.02.1924

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Do amor e suas palavras




“Falo do amor de forma mística, sei o preço. (…) 

Sou muito inteligente, muito exigente e muito engenhosa 
para alguém ser capaz de se encarregar completamente de mim. 
Ninguém me conhece nem me ama completamente. 
Só tenho a mim” 


Simone de Beauvoir

Sedução.

A sedução dos olhos.
A mais imediata, a mais pura.
A que prescinde de palavras; só os olhares enredam-se 
numa espécie de duelo, de enlaçamento imediato,
à revelia dos outros e seus discursos:
discreto fascínio de um orgasmos imóvel e silencioso.
Queda de intensidade quando a deliciosa tensão dos olhares
se rompe em seguida com palavras ou gestos amorosos.

Jean Baudrillard

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Flores raras.




Escolho palavras
como flores
Colho surpresa
 poesias.

Andréa Beheregaray

Perdição.




Gente perdida é assim, 
tem aquela energia que circula no corpo 
e explode no mundo. 
Que pode ser luz sabe ser também tempestade.
Potência dos sonhos mais altos 
e dos vãos mais profundos.  


Todos os dias somos centenas 
em busca do caminho dos que não se perdem nunca,. 
Estrada de gente achada é estrada mil vezes trilhada. 
Não é construída, é dada. 
Não é particular, por isso é nada. 
Estrada assim é pra quem tem medo da vida, 
gente que quer caminhar sabendo sempre onde vai chegar.

Talvez se fossemos homens,
 talvez se fossemos cegas,
 Mas não somos. 
Ser mulher na estrada da perdição é tormento. 
Bênção e solidão.
E mesmo quando ha encontro, 
sabemos seguir na direção do 
desconhecido. 
 
Estra perdida é condição. 
Numa estrada é carregada de vida, 
Nossa estrada é de coração.

Andréa Beheregaray 

O filósofo e a aluna.




"Fujo para longe de ti,

evitando-te como a um inimigo,
mas incessantemente
te procuro em meu pensamento.
Trago tua imagem em minha memória
e assim me traio e contradigo,
eu te odeio, eu te amo."

Carta de Abelardo a Heloísa.

*Pedro Abelardo,
filósofo francês 
(1079-1142).

domingo, 11 de dezembro de 2016

O amor da poetisa.




Apaga meus olhos: eu posso te ver
Fecha meus ouvidos: posso te ouvir
E mesmo sem pés posso ir a ti
E mesmo sem boca posso te invocar.
Arranca-me os braços: eu te prendo
Com meu coração como com uma mão
Dilacera-me o coração: e meu cérebro palpitará
e mesmo se fazes do meu cérebro um braseiro
Eu te levarei em meu sangue.

Lou Andréas Salomé
para Rilke.
in Livro das Horas

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Poema Incompleto.




Eu habito palavras
E elas queimam
Eu habito palavras incendiadas
Palavras secas, palavras mortas
E elas ecoam
Durante a noite
Feito o uivo dos cães. 

Andréa Beheregaray

domingo, 4 de dezembro de 2016

A permanência do Poeta.

Bela bela mais que bela
mas como era o nome dela?
Não era Helena nem Vera
nem Nara nem Gabriela
nem Tereza nem Maria
Seu nome seu nome era...
Perdeu-se na carne fria
perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia
perdeu-se na profusão das coisas acontecidas
mudou de cara e cabelos
mudou de olhos e risos
mudou de casa e de tempo
mas está comigo está
perdido comigo
teu nome


Ferreira Gullar(04/12/2016)

A favor de mim.




Só uma coisa a favor de mim eu posso dizer: nunca feri de propósito.
E também me dói quando percebo que feri.
Mas tantos defeitos tenho.
Sou inquieta, ciumenta, áspera, desesperançosa. 
Embora amor dentro de mim eu tenha. 
Só que não sei usar amor: às vezes parecem farpas.
Quando o amor é grande demais torna-se inútil: 
já não é mais aplicável, 
e nem a pessoa amada tem a capacidade de receber tanto.
Fico perplexa como uma criança ao notar que 
mesmo no amor tem-se que ter bom senso e senso de medida.
Ah, a vida dos sentimentos é extremamente burguesa.

Clarice Lispector